A cultura do dar e ter que receber

 
       
 

Vivemos dentro de um sistema de vida bem complicado, onde existe a "cultura do dar e ter que receber", ou seja, um sistema de troca consciente ou inconsciente, em que se espera o retorno de tudo aquilo que se faz pelo semelhante.

Não entrarei no mérito se isso é certo ou errado, pois não acredito nisso para o campo existencial. Mas, posso entrar no mérito de ser bom ou ruim. Particularmente, vejo este sistema de "cultura do dar e ter que receber" como algo muito ruim, seja para quem dá, seja para quem recebe.

O que recebeu se sente em dívida com quem deu. E o que deu, se sente credor daquele que recebeu. Cria-se a expectativa de um retorno. Cria-se a expectativa de um reconhecimento. Isso, é o Ego atuando. É uma cultura altamente egocêntrica.

Entendo que dar, se doar e se dedicar a alguém, não é uma questão de troca, mas sim de compartilhamento. Acredito que seja algo que se faça por amor ao semelhante, sem esperar nada. Uma vontade que surge a partir do amor-próprio de quem se propõe a se doar.

As pessoas olham o amor-próprio como um sentimento que se reverterá apenas para elas. Eu vejo o amor-próprio de maneira mais ampla; também como uma energia constante, intensa e muito forte, que existe em cada um de nós, capaz de atingir nossos semelhantes, circulando constante e invariavelmente.

Quando despertamos nossos amores-próprios, de verdade, sentimos que se trata de uma energia tão imensa, que não cabe dentro de nós. Daí vem a necessidade de jorrá-la às pessoas. É uma energia altamente circulante que precisa ser compartilhada. Acreditem: isso tudo ocorre de forma espontânea. Não há esforço para este compartilhamento.

Quando nos movemos pelo amor-próprio, passamos a fazer pelos semelhantes aquilo que faríamos por nós. Certamente, quando fazemos algo por nós mesmos, não nos cobramos retornos por essas ações. Apenas fazemos por nós, por puro amor. Quando fazemos por nós, não retiramos aquilo que não temos, não é mesmo?

O Ego, muitas vezes, é o pai das expectativas. A questão é que expectativas, quando não atendidas, revertem-se em frustrações. Logo, o Ego é frustrante também.

Quando nos doamos aos nossos semelhantes pelo amor-próprio, aprendemos a dar apenas aquilo que podemos dar; aquilo que não vai nos faltar. Passamos a nos doar com qualidade e, certamente, quem está recebendo sentirá a energia das boas e ações.

A "cultura do dar e ter que receber" é permeada pela falta. Quem dá, está doando aquilo que lhe fará falta e quem recebe entende que está recebendo aquilo que faltará a quem doou.

Esta "cultura do dar e ter que receber" tem origem nas religiões, começando pelas condicionantes impostas às pessoas para a obtenção do amor e do perdão Deus e entidades.

Geralmente, as religiões não estimulam o amor-próprio. É o tal perdoar para ser perdoado. É o tal é dando que se recebe. Tudo é relacionado ao mundo externo, a uma troca e não ao interior de cada um.

Percebam que, se essa "cultura do dar e ter que receber" desse certo, não teríamos hoje uma imensa massa de pessoas sentindo vazios e, consequentemente, infelizes.

Isso afeta as pessoas no trabalho e nos mais diversos níveis de relações. Quantas e quantas vezes já ouvimos pessoas reclamando da ingratidão das outras?

Este texto é mais um que escrevo para que as pessoas reflitam sobre o amor-próprio que, para mim, é o princípio, meio e fim da nossa existência.

 

 

Por Marcelo